Meu cavalinho de pau
Crioulo da fantasia
Tinha cola que não crescia
E a boca sem comer pasto
Tinha o lombo meio cião
E o pescoço de gavião
E uma rachadura no casco
Tinha raça de taquara
Cruzada com carafá
Delgado como um virá
E com o pêlo bem pangaré
Parente da cobra verde
Com seu galope de rente
Ia escrevendo com o pé
Brincando de faz-de-conta
Lhe ensinei a velhaquear
Dar coices e a escramuçar
Com jeito de um redomão
Só nunca pude frastrá-lo
Sofrenado, o meu cavalo
Fincava a cola no chão
Com a cola dele pra o céu
Apontava a estrela guia
Com o olho na pontaria
Mirava pros pica-paus
Pauleava as caranguejeiras
E as gatas namoradeiras
Que me aturdiam aos miaus
Batia os galhos das arvores
Derrubava frutas no chão
No ombro foi mosquetão
E espada para o meu cinto
No seu galope macio
Nas longas tardes de frio
Tropeei ninhadas de pinto
Corri carreiras de a pé
Medi fundura de poço
Fiz raia pra jogar osso
E guiada pros bois da pipa
Fiz flechas pra os meus caminhos
Furei o fundo dos ninhos
E o bando das caturritas
Um dia, jogando talho
Outro piá espadachim
A olada não foi pra mim
E às brincas, perdi o jogo
Quebrou-se o meu cavalinho
No outro dia bem cedinho
Virou gravetos pra o fogo