Sobrou a lama no chão
Do açude que evaporou
Quando a seca chegou
Esturricou o sertão
O grão vingou mal nascido
Sem tempo de ser nutrido
Perdeu seu sal seu amido
Virou um triste torrão
A flor que brotou na terra
Brigou lutou e fez guerra
Não pode a seca vencer
Do céu não choveu fartura
Nasceu só pé de amargura
Pro nordestino colher
Quem sofre passando fome
Leva nos peito essa vida
Num estirão de feridas
Semeia a flor do seu nome
Eu mesma sei por que noto
A feira livre dos votos
Nas eleições e anoto
Em meu caderno o padecer
Vejo essa gente valente
Sem pão sorriso sem dente
A dignidade vender
São mais quatro anos de peia
Suando na terra alheia
Lambendo o sal do sofrer
A certidão nordestina
Trago nos couros gravado
E calo é corte e é topada
Nas linhas tortas da sina
Os traços do meu avô
Em meu genoma pousou
Seu dna se afincou
No chão da minha cantiga
Trabalho verso enxadeio
E quando vejo alumeio
No céu esqueço as fadigas
Pego a viola então canto
Por que cantando eu espanto
As desventuras antigas
Vivendo só de conversa
O sertanejo cansado
Apenas quer seu bocado
Sem ter que ouvir mais promessa
Que um dia a nossa vida
Será mais farta e sortida
E a terra bem dividida
Pra trabalhar e colher
E já que nesse lugar
Em se plantando se dar
Melhor a gente fazer
Um adjunto e plantar
Pés de vergonha e sonhar
Pra melhorar o viver
Plantar o grão da verdade
Pra um dia a honestidade
Servir pro povo comer