Olha a criança, olha o frio, olha a fome, olha o ódio, olha o terror,
E a gente?
A gente? Olha; a criança, o frio , a fome, o ódio, o terror.
Tem gente que vai na casa da gente, filho no colo pedindo um pedacinho de pão.
E a gente fala de barriga cheia, vai trabalhar vagabundo saia do meu portão.
Criança pedindo esmola na rua, jogando bolinha, lavando o vidro com água e sabão.
E a gente fecha o vidro do carro, fala pro filho do lado: "Isso aí é tudo ladrão!"
Menina não brinca mais de ciranda, vende sua infância na cama em troca do arroz com feijão.
E a gente vai embora todo gozado e a menina vira pro lado com uma boneca na mão.
Menino se vicia e se droga e vai pra porta da escola armado de faca e canhão,
E a gente logo chama a autoridade que chama o menino de lado se explica aí, malandrão!
Eu já fui passarinho, de asa quebrada, levando pedrada, se arrastando no chão.
Hoje eu vôo alto, com a garra afiada,
Rasgando sua carne, sou um gavião.
Sou um gavião, sou um gavião, sou um gavião, sou um gavião.
Olha a bala, olha água, uma moeda meu senhor.
Não machuque a criança, ela é só um botão de flor.
Olha o frio, olha a fome, olha o ódio, olha o terror.
Sou um gavião, sou um gavião, sou um gavião, sou um gavião.