Ela não tem tudo e também não tem nada
Não tem pai não tem mãe ela foi abandonada
Não recebeu carinho e também não foi amada
Não dá amor porque pela rua ela foi criada
Não brinca de esconde-esconde nem de amarelinha
Nunca viu ninguém dizer te amo minha filhinha
Não tem mais aquele, aquele brilho no olhar
E também não acha graça ne quem gosta de brincar
Essa é a verdade, verdade nua e crua
Alguns pensam que sim, mas não é fácil viver na rua
Ninguém vai te escutar mesmo que você grite
Acontece coisas que eu não digo
Porque o horário não permite
Nem tudo é feito um para o outro como a mão e luva
Ninguém adotou porque viu ela na chuva
Perdeu o medo do escuro mas tem medo do bicho
Falam que quem vive assim é boneca do lixo
Refrão
Eu só queria o seu carinho
E também o seu amor e ficar do seu ladinho
Só que isso é um simples sonho
A minha realidade é viver no abandono
Bicho papão pra ela não se esconde no armário
Sob os olhos da lua sobreviver é necessário
Andando pelos quatro cantos sol, chuva sem destino
Isso não foi opção foi abandono assassino
Falha pesada daqueles que falham com essas pessoas
Como será que conseguem viver numa boa?
Incapaz de defender-se as drogas consomem
Pra enganar a sede, o frio, o abandono e a fome
Papai noel que nunca vem trazer presente pra ela
Desacredita de todos que se aproximam dela
A hora do pesadelo e quando está acordada
Mais fácil dormir de dia quando não é enxergada
Bicho papão pra ela não é nada
Pessoas tem tudo e são bem tratadas
às vezes pensam em fugir de casa
Não sabem o que é ser abandonada
Refrão
Eu só queria o seu carinho
E também o seu amor e ficar do seu ladinho
Só que isso é um simples sonho
A minha realidade é viver no abandono
Vida amordaçada moída a grão de areia
Infância perdida onde a fome é o que semeia
A nação não adotou, muito pelo contrário
Raptou escravizou, transformou sonho em trabalho
Apenas dez anos de vida que é o que vale a mil
Exploram até sua alma sua infância sucumbiu
Na roça queimando carvão, ou nos malabares no farol
Na chuva, no vento, no frio
não importa se é de sol à sol
Envelhecimento precoce calos nas mãos
E a ferida que mais o machuca não tem cicatrização
Coração, que bate a mil não existe massinha de modelar
E o brinquedo que ele domina não foi feito para brincar
Carpintaram a sua esperança
a foice cortou sua infância
Fizeram acreditar que utópico a bonança
Escravos de jó ainda jogam o cachangá
Tire a enxada da criança e deixe ela se sujar
Refrão
Eu só queria o seu carinho
E também o seu amor e ficar do seu ladinho
Só que isso é um simples sonho
A minha realidade é viver no abandono