Ó Lua Cheia, cheia de graça!
Esse teu bojo está repleto de cachaça
Apaga a luz, sem ninguém ver
E abre-te ao meio o teu recheio
Estou danado por beber
Tu não és mais que um garrafão
Que aqui me prende em sacrossanta devoção
Oh vagabunda lá do espaço
Dai-me o braço e passo a passo
Vamos tomar um formidável bom pifão
Fui o primeiro astronomeiro
Que descobriu quem sabe és irmã da opa
E que vem sempre ao botequim
Do Joaquim, o português
Que até dizia "O vi tontim"
Tu és oropa, redonda e branca
Perambulando pelo azul do firmamento
Neste momento és um acento
És uma anca de mulher
Numa concavidade ambígua de colher
De hoje pra trás, não bebo mais
Eis a promessa que ora faço com fervor
Eu só não bebo a aguarrás
Mas tu, ó lua, bebes chumbo derretido e pedes mais
Vivo na rua e tu no céu
Mas nos irmana o mesmo vício, o mesmo amor
Por isso para que mentir
Sou como tu de um crime réu
Se acaso é crime se beber até cair
Lua pau d'água a minha mágoa
É não morar no alambique a vida inteira
Tendo-te a ti por companheira
Na sempre eterna bebedeira
E na ressaca habitual
Nesta sarjeta cheia de lama
Onde me encontro vejo a coisa muito preta
Pois o tal de guarda noturno
É um malvado sem igual
Que vem soturno escangalhar minha bacanal
Oh lua adeus, deixa-me andar
Vou procurar algum lugar pra vomitar
Tenho a na boca a impressão
E a sensação do gosto mal
De um cabo de chapéu de sol
Fujo de ti, pois és capaz
De vomitar por sobre mim o parati
Me encontrarás no botequim
Fiel ao que já prometi
De que não bebo nunca mais
De hoje pra trás
Me diga se uma talagada, de vez em quando
Não, não faz até ficar vivo ou morto, hein?