Tem vezes que parece
Que a vida gruda, no arame farpado
Da cerca da roça do mundo
E a gente sai rasgando, sem perceber, a pele
Que é roupa do espírito manso que andava nu
Entre as cercas e o mato
Que crescia verde, floresta de mim
Brota o sol pela fresta
Janela entreaberta, nos olhos de mim
Pode ser que eu nem veja, nem perceba
Que tinha uma cerca ali
Me impedindo apenas de ser
Se tiver mais alguma
Eu atravesso, eu me rasgo todo
Eu sangro, eu morro sem medo de ver
Que no meio da relva
Brotou a semente daquela canção
Vento derruba as folhas
Dos galhos já secos do meu coração
Não há como ficar inteiro nesse roçado
Arar a terra e não trazer nos dedos os calos
Plantar suas sementes sem pegar na enxada
Sem enfiar a mão na terra
Sem chorar sangue e água
Ser humano é estar entre o imediato e o imortal
É a luta interna e bruta
Do bem pra vencer o mal
É desatar os nós entre o eu e o nós
Entre o pré e o pós
Entre a multidão, mas a sós