A noite passada acordei com o teu beijo
Descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
Vinhas numa barca que não vi passar
Corri pela margem até à beira do mar
Até que te vi num castelo de areia
Cantavas: „Sou gaivota e fui sereia“
Ri-me de ti: „Então porque não voas?“
E então tu olhaste
Depois sorriste
Abriste a janela e voaste
A noite passada fui passear no mar
A viola irmã cuidou de me arrastar
Chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
Olhei para baixo dormias lá no fundo
Faltou-me o pé senti que me afundava
Por entre as algas teu cabelo boiava
A lua cheia escureceu nas águas
E então falámos
E então dissemos
Aqui vivemos muitos anos
A noite passada um paredão ruiu
Pela fresta aberta o meu peito fugiu
Estavas do outro lado a tricotar janelas
Vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
Cheguei-me a ti disse baixinho: „Olá!“
Toquei-te no ombro e a marca ficou lá
O sol inteiro caiu entre os montes
E então olhaste
Depois sorriste
Disseste: „Aínda bem que voltaste!“