José acordou bem cedo, outro dia de trabalho
arrumou sua mochila rasgada pra pegar o balaio
O toró ainda caia, seu guarda-chuva furado
e José aqui é só mais um cidadão ferrado
O sol não saia, uma nuvem negra e espessa
Na construção José não entendia
não tem mais tinta em sua caneta
Ele disse quando chegasse o dilúvio
ofereceria ao barqueiro usando capuz
duas pedras moldadas com a forma de sua cabeça
"aceite meu bom barqueiro, pois eu não tenho moedas
construí todos esses prédios e ainda moro na favela
A minha grande sina é tentar sobreviver
pois pra mim e pra muita gente
o que resta é morrer"
Ao som de uma tela pintada à noite
com o cheiro da corrente que arrasta
E da minha janela vejo o mundo imundo
que deixa mudo e paralisa
E deixa o quase pobre pobre e o pobre podre
E deixa o nobre cada vez mais podre de rico
E deixa o rico cada vez mais podre e mais nobre
E o pobre podre e quase pobre pobre, podre
"Ele me promete um Brasil sem miséria, sem fome
sem desilusão. Ele promete a dentadura, promete
a mesa sem faltar o pão. Ele promete o que a gente
quiser que ele prometa, acima do bem e acima do
mal. Promete acabar até com o capeta se chegar
no planalto central. "