Meu velho Fado Corrido,
se foste dos mais bairristas,
porque te mostras esquecido
na garganta dos fadistas?
Explicou-me um velho amigo
como o Fado era tratado.
Tinha graça, o Fado antigo,
da forma que era cantado.
Um ramo de loiro à porta indicava uma taberna.
À noite era uma lanterna,
com sua luz quase morta.
Como o fado tudo “importa”
foi sempre a taberna abrigo
do meliante ao mendigo,
da desgraça e da miséria.
Também tinha gente séria,
explicou-me um velho amigo.
Sob os cascos da “vinhaça”,
deitada em forma bizarra,
estava sempre uma guitarra
para servir de “negaça”.
O canjirão da “murraça”,
de tosco barro vidrado,
andava sempre colado
aos copos p’lo balcão.
E era assim nesta função
como o Fado era tratado.
Se aparecia um tocador,
às vezes até “zaranza”,
pedia ao tasqueiro a banza
para mostrar seu valor.
Logo havia um cantador,
dando o tom de certo perigo,
provocava o inimigo
num cantar à desgarrada.
Até às vezes com “lambada”, tinha graça, o Fado antigo.
Pouco tempo decorrido,
cheia a taberna se via
p’ra escutar a cantoria
ao som do Fado Corrido.
Todos prestavam sentido
quando alguém cantava o Fado.
O tocar era arrastado,
o estilo dava a garganta.
E hoje pouca gente o canta
da forma que era cantado.
Escutei com atenção
um cantador do passado
e a sua linda canção
prendeu-me p’ra sempre ao Fado.
Por muito que se disser,
o Fado é canção bairrista.
Não é fadista quem quer
mas sim quem nasceu fadista.”