Ai ai ai ai
Que se sente
Uma sofreguidão
Ver a linha do horizonte
Sumir da palma da mão
As janelas de fernando ribeiro
Um olho amargo
(ele sabe que eu sei que ele sabe)
Onde tudo meio longe meio guerra
Santo cidade era
Mais que dúvida e alguma coisa dela era
Buscar deus e dinheiro ou não era
E o vento ventava fora do coração
Tudo passa assim tão rápido
Vejo nos outros
Em mim nunca, não
Que um dia terá de algum templo
De algum ângulo
A melhor visão
Talvez saiba o que quero
O que busco
E eu nem ao menos noção
Não lembro mais nomes, batalhas, heróis
Datas, coisas assim
Relógios
A madeira esculpida nas portas da solidão
Quem poderá dizer que algum dia
O que já foi
Se ninguém sabe aonde vai
Onde vão
Observando províncias, nações
Sentado em uma assombração
À beira d'água vermelha
Lendo o alcorão
O céu oriental brilhava em pingentes
Diamantes
Um sinal, talvez não
O barro molhado entre os dentes
Entre os dedos dos pés
Cinema da carne, meditação
Sonhos mal dormidos que sonho até hoje
Til de um futuro
Que não rima em -ão, outras línguas,
Nem incompreensíveis
Sem nenhuma explicação
Ai ai ai ai
Que se sente
Uma sofreguidão
Ver a linha do horizonte
Sumir da palma da mão
Nem sei mais continente
Qual continente, por onde contar
De início, de trás pra frente
Desafetos vão se travar
Com um passado recente
Que a gente faz que acredita
Com a cabeça entre as mãos
Um símbolo, um ícone
Arde e palpita
E o meu sexo exposto
Índios e crianças
Em praça pública
Um mercado árabe
Facas de prata, o brilho de antares
O couro esticado de animais mortos
Moscas, homens também mortos
Sangue furo de balas
Coisas raras, tudo como uma maldição
É o que dizem as roupas
Os metais cunhados em armas frias
Dos cortes
Que lendas
Que coisas mais serão tão antigas
Contadas
Rugas de um rosto sem vigas
Terra da alma, olhos em demolição
E pentes penteiam morosos
Cabelos tão negros
Paisagens de portinari
Janelas de tanta cor
Acalmam os pensamentos
Os dias se incendeiam
Em azuis de dor
Tão cegos sem duração
Onde mulheres tatuaram meu corpo
Em luas de sedução
E vão de tudo aí
Se lê de tudo um pouco
E de tudo todos já viram
E assim continua tudo exatamente igual
Que nem mal não faz
Ás de ouro, por baixo do pano, propina
(flor de especial, de primeira)
Tás louco, que estória sovina
Ladrão!
Retruco!
Quero vale quatro
E nunca mais, nunca mais dizia
Eu e o corvo
Mas de novo
Pus um ovo
Uma milonga de paus
Dentro do coração
Ai ai ai ai
Que se sente
Uma sofreguidão
Ver a linha do horizonte
Sumir da palma da mão.