Olhar pra esse varjão
Que um dia foi meu sertão
Me causa tanta tristeza
Por ganância e ambição
Na ideia de um figurão
Foi feita a grande represa
Onde corria o mateiro
Tinha angico, cravoeiro
Sucupira e jacaré
No mesmo cerrado agora
O povo que vem de fora
Já pesca tucunaré
É de causar muita mágoa
Está debaixo das águas
A minha velha moradia
Todo ano mês de maio
Meu pai com gosto e trabaio
Dava um pouso de folia
Desde quando era menino
Que a folia do Divino
Fazia esse roteiro
Eu esperava a folia
Para ouvir o mestre Dias
Na saudação do cruzeiro
Eu morava na baixada
De guariroba formada
Des alqueires de cultura
Bem na beira do caminho
Era humilde o meu ranchinho
Nós nadava na fartura
Eu colhia neste chão
Milho, arroz e feijão
E cana pra rapadura
Um mandiocal bem formado
E no chiqueiro algum capado
Me garantia a gordura
Veio o homem da represa
E disse, por gentileza
Assine esse documento
Está desapropriado
Mas fique bem sossegado
Que terá seu pagamento
E por uma ninharia
Sem pensar no que eu sentia
Lá se foi o elemento
Deram pra calar minha boca
Uma quantia tão pouca
Que nem vale o sentimento
A água veio subindo
E meu ranchinho sumindo
Como se a pedir socorro
Minha família chorou
E a represa me empurrou
Aqui pra cima do morro