Ao Eduardo e ao Luciano
Dois netos- prolongamentos
Das ânsias dos quatro ventos
Do pajador veterano
Pra que guardem mano a mano
As tradições de raiz
Quem sabe se esses guris
Depois que eu me for embora
Não vão fazer mundo à fora
As pajadas que eu não fiz
Volto a sombra do arvoredo
A escola grande da infância
A minha primeira estância
Onde aprendi- desde cedo
A descobrir o segredo
Das coisas do dia a dia
Na misteriosa magia
Que nunca mais é esquecida
As coisas simples da vida
Que a vida nos anuncia
Me sonho, guri campeiro
No rancho onde fui criado
O varzedo aveludado
Do meu pago missioneiro
Meu universo primeiro
Que não consigo olvidar
O tempo pode passar
Mas nunca esquecerei isso
Quando caí de um petiço
Foi que aprendi engatinhar
O gado de osso, a peonada
Os galpões- os alambrados
Os palanques encravados
Os esteios da morada
Os potreiros da invernada
No silencioso sossego
La maula- a lembrança, o pago
Que me chegam do passado
Vejo um sabugo encilhado
Com uma garra de pelego!
Depois
A adaga de tala
Que a gente mesmo prepara
Um trabuco de taquara
Dos que não precisam bala
E as ordens de meia fala
Da peonada imaginária
A tendência hereditária
Que sem saber-se descobre
Assim o guri pobre
Tem infância milionária
E as brigas de faz de conta
Os apartes os corcovos
E os velhos brinquedos novos
Que a própria vivência aponta
E as tropas que se reponta
Da invernada pro potreiro
E o patrãozinho estancieiro
Que no meu ser se encarnava
Quando, bufando escarceava
Numa lhaça de coqueiro
Piazedo aqui está um guri
Que te beija em pensamento
Lembrando neste momento
A querência onde nasci
E os que sofrem por aí
Sem pão, sem pais, sem carinho
Eu também já fui piazinho
E ás vezes me dá uma ânsia
Tento retornar a infância
Mas não encontro o caminho