Patrão! É o negro venâncio
Que pede vossa licença
Pra vos dizê que a vicença
Morreu de parto, patrão
E ao ir pra baixo do chão
Não tinha nada de seu
Só deixô quando morreu
Este negrinho chorão
Neto da negra donata
Escrava do vosso avô
A negra que amamentou
Vacês tudo, patrãozinho
Por isso eu truxe o negrinho
Afim que vacê o ajeite
Pois mais do que ropa e leite
Ele percisa carinho
A vincença, miseráve
Morreu sem le botá nome
E aqui está, roxo de fome
O pobre entinho bendito
Sem força nem pra dá um grito
E os óinho cheio d’água
Refretindo a triste mágoa
De tê ficado solito
Me alembrei que a patroinha
Há pocô ganhô famia
Patrão, quem sabe ela cria
Como paga de um favor
Esse entinho sofredô
Pialado da sorte ingrata
Pois é neto da donata
Que foi vossa mãe de cor
Não fique bravo, patrão
Nem tome por desaforo
Mas óie que ouvindo o choro
Desse negrinho mijado
O índio mais calejado
Tem vontade de sê bão
E chega a pedir perdão
De tudo quanto é pecado
Adiscurpe, meu patrão
Eu sinto o que vacê sente
Contemprando esse vivente
Que as lágrimas nos arranca
Mas vai vê que o choro estanca
E o negrinho da vicença
Nem vai achá diferença
Entre mãe preta e mãe branca
Já vô simbora, patrão!
Nosso sinhô o abençoe
E ao mesmo tempo perdoe
Aqueles que tudo tendo
Passam a vida, não vendo
Cegados pela luxúria
A miséria e a penúria
Dos que já nascem sofrendo