Quando te vejo, meu verso
Junto à multidão que passa
Entre os fidalgos de raça
Da poesia aristocrata
Meu coração se desata
E se larga campo a fora
Paleteado pela espora
Da emoção que me arrebata
Pois tu nasceste num rancho
Barreado de chão batido
E assim desapercebido
Foste piá, e homem depois
Sempre havendo entre nós dois
Alma de um no corpo de outro
Amor à China e ao potro
E ao berro amigo dos bois!
Eu fui tudo que tu foste
Antes de ser o que sou
Pois a vida nos ligou
No velho ajoujo da sorte
Esse tento rijo e forte
Sovado a custa dos anos
Que acolhera os desenganos
Do nascimento até a morte
Porém, meu verso crioulo
Contrariando a velha lei
Eu de ti me seperei
Já não sou mais como tu
Que te conservaste cru
Pois já estou domesticado
Povoeiro, civilizado
E, tu, ficaste xiru
Por isso é que tenho inveja
De ti, meu verso bagual
Que soubeste ser igual
Depois que os anos passaram
Pois jamais te embuçalaram
Cerceando-te a liberdade
Nem conheceste a saudade
Dos que a querência deixaram
E agora enquanto me paro
Numa fila de cinema
Tu escutas a seriema
Junto a barranca da sanga
E enquanto comes pitanga
Nalgum capão solitário
Eu vou chinchando o horário
Mais preso que boi na canga!
Dá de rédeas no teu pingo
Na direção da querência
Se alguém notar tua ausência
Não faz mal, isso tem cura
Vai rever a saracura
E o quero-quero alarmento
Banhando o corpo emplumado
Nas restingas de água pura
E um dia, quando souberes
Que este gaúcho morreu
Não'algum livro serás eu
E nesse novo viver
Eu somente quero ser
A mais apagada imagem
Deste rio grande selvagem
Que até morto hei de querer!