Um poema não é algo
Que se apanha no ar
Como um pássaro
Que se cativa para o canto
Um poema não é algo
Que se apanha na terra
Como a flor
Que se colhe para o vaso
Um poema não é algo
Que se apanha nas águas
Como um peixe
Para a luz dos aquários
Não, o poema não se apanha
O poema desce na gente
Como um sopro do alto
Para transfigurar-se em música
E beleza na sesmaria branca do papel
Nasce como um filho
Das entranhas da mãe
Na hora certa da vida
Nem antes, nem depois
Sempre na hora certa da vida
Que nunca é a hora certa dos que tentam buscá-los
No longe onde ruminam verdes e horizontes
Como estranhos animais de outras esferas
A hora do poema
Não é a hora da obediência
Não e nem mesmo
A hora dura dos poetas
O poema não atende a quem o chama
Como um cão ao assovio, ao nome
Porque existe sem ser, vem por suas asas
Como vem a liberdade, e vem os ventos
E aí se entrega
Como a bem amada
Flor para as mãos
De quem não tinha nada
Disseste que ao contrário dos humanos
Os rios não envelhecem nos seus trilhos
E obrigado por também me haveres dito
Que o pai é um rio que segue nos seus filhos